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Projeto de Ciência Cidadã – A Poluição Avaliada em Cascas de Plátano

A Ciência Cidadã é um conceito que pretende promover sinergias entre cientistas e cidadãos de modo a alargar o âmbito das investigações e a aumentar a literacia científica. Os projetos de ciência cidadã promovem o envolvimento dos cidadãos que colaboram com o seu conhecimento, com os seus recursos e com o seu esforço intelectual.

No âmbito do seu campo de investigação, Mário Moreira e Graça Silveira, ambos do Departamento de Física do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) e investigadores no Instituto Dom Luiz (IDL) e Ermelinda Ribeiro, bióloga delinearam um projeto de investigação científica para utilizar a acumulação passiva de micropartículas metálicas pelas cascas de árvores como um método de avaliação da poluição do ar. As micropartículas metálicas que se encontram no ar das cidades têm origem maioritariamente no processo de combustão dos combustíveis fósseis e nos materiais abrasivos incorporados nos travões dos veículos automóveis. A sua quantificação poderá permitir a identificação das zonas mais poluídas e assim permitir delinear estratégias para minorar os efeitos nefastos desta contaminação. Por exemplo restringir a circulação em alguns locais, plantar árvores para funcionarem como barreiras e acumuladores das micropartículas metálicas em corredores mais afetados ou ainda conceber outros modos de intervenção.

A quantidade de micropartículas metálicas pode ser avaliada usando métodos de análise magnética dos materiais, em particular da suscetibilidade magnética em biocoletores como as cascas de árvores, sendo o plátano uma opção com muitos aspetos positivos.

Os plátanos são árvores muito utilizadas nas zonas urbanas, quer em parques quer ladeando as ruas e estradas. Pelo facto da casca da árvore ser capaz de absorver e reter partículas metálicas muito finas, a vasta distribuição desta árvore torna-a uma boa candidata a ser utilizada para a avaliação desta contaminação nas zonas urbanas. Acresce ainda que o plátano elimina anualmente a camada mais externa da sua casca o que permite uma avaliação anualmente renovável e uma utilização sem necessidade de danificar a árvore. Assim, o plátano aparece como uma excelente escolha para avaliar a contaminação das partículas metálicas, através do estudo da sua casca.

Uma investigação da poluição numa cidade, que tenha um verdadeiro impacto em termos de informação coligida, em particular da poluição por micropartículas metálicas associadas à ação do tráfego automóvel, requer a recolha de dados em muitos locais, pois a variação pode ser bastante significativa mesmo em locais muito próximos. Sabe-se por exemplo que na mesma rua as leituras da suscetibilidade magnética podem variar em poucos metros dependendo de fatores como a proximidade de um semáforo, a inclinação de uma rua, ou o número de carros que param num dado local, por exemplo à porta de uma escola.

Com o objetivo de fazer uma cartografia o mais pormenorizada possível da poluição por micropartículas metálicas na cidade de Lisboa, os promotores deste projeto pensaram na possibilidade de o integrar numa atividade de Ciência Cidadã com a participação da comunidade escolar que permitiria aumentar muito as zonas a serem amostradas além de permitir a interação importante entre os alunos e o mundo da investigação científica. Foi neste contexto de Ciência Cidadã que eu entrei como cidadã bióloga e ex-professora. Tive a grata tarefa de apresentar o projeto a colegas professores de várias escolas, assim como de o ter apresentado a duas turmas de alunos na Escola Secundária Rainha Dona Leonor, tendo a excelente adesão sido muito gratificante.

Neste momento participam 12 escolas que integram alunos do 1º ciclo ao secundário. Já muitos alunos realizaram trabalhos de recolha de informação sobre os plátanos, sobre a poluição urbana ou sobre o magnetismo, já divulgaram o projeto aos seus familiares e aos outros elementos da comunidade escolar, alguns já recolheram as cascas dos plátanos e agora vão entrar na fase de laboratório em que vão poder ter acesso ao laboratório e, eles próprios, determinar a suscetibilidade magnética das suas amostras. A primeira carta com a identificação da contaminação por micropartículas metálicas na cidade de Lisboa determinada por suscetibilidade magnética das cascas de plátanos está a caminho.

Avaliar a qualidade do ar usando cascas de árvores

A qualidade do ar é extremamente importante para a preservação da saúde das pessoas. Muitos estudos têm sido feitos sobre este tema e já foram estabelecidas associações entre determinados poluentes, como o ferro, e várias patologias.

O ferro que existe no ar e que constitui um poluente potencialmente perigoso para o Homem tem origem principalmente nos travões dos veículos, nos carris dos elétricos e dos comboios, assim como em processos metalúrgicos.

O ferro (Fe) assim como outros elementos metálicos são potencialmente prejudiciais para os seres humanos pois podem reagir com o oxigénio do ar formando óxidos que causam inflamações no corpo. Por exemplo, há indícios de que a magnetite, um óxido de ferro (Fe3O4), que existe no ar pode entrar no cérebro pela via respiratória e desencadear o desenvolvimento de Alzheimer.

Tendo em vista a manutenção de um ar de qualidade no planeta e em particular nas zonas urbanas é indispensável a sua monitorização regular.

Habitualmente são utilizadas estações de monitorização de qualidade do ar, no entanto a qualidade do ar varia muito mesmo em curtas distâncias, sendo por exemplo bastante diferente a qualidade do ar numa rua inclinada junto a um semáforo e a uma paragem de autocarro e na mesma rua numa zona sem inclinação e sem obrigatoriedade de parar. Assim, é muito importante que para um controlo eficaz da qualidade do ar sejam identificados, à escala local, os pontos associados a uma diminuição dessa qualidade para que possam ser tomadas as devidas medidas de remediação.

Plátano – Platanus orientalis com casca fácil de recolher

As cascas das árvores são um material potencial para o estudo da poluição por partículas do ar uma vez que sendo constituídas por tecido morto elas são acumuladores passivos dessas partículas. Acresce ainda que as árvores se encontram dispersas nas cidades. A quantificação das partículas, em particular dos óxidos de ferro, nos seus sumidouros, a casca das árvores, poderá ser um indicador útil da poluição do ar.

O ferro é um elemento indispensável às plantas para a síntese de várias proteínas e como tal faz parte dos elementos químicos que a planta precisa de ter à disposição nas suas células. Assim, as plantas adquirem o ferro do solo, juntamente com a água e outros nutrientes.

Após a sua entrada nas raízes, o ferro (Fe3+) entra nos tecidos de transporte da seiva bruta, o xilema, sendo progressivamente levado ao caule, às folhas e às sementes. O ferro (Fe2+) é também transportado no tecido de transporte da seiva elaborada, o floema, percorrendo todos os órgãos da planta.

Assim, a casca das árvores está exposta ao ferro, quer através do interior da árvore quer pelo contacto com as partículas presentes no ar, no entanto, parece ser de aceitar, como sugerem alguns trabalhos, que o valor correspondente ao ferro com origem no transporte a partir do solo é desprezável, pelo que a casca das árvores é um bom material para avaliar a poluição do ar.

Sendo o ferro um elemento com propriedades magnéticas, e podendo ser um indicador da qualidade do ar, a avaliação da poluição do ar pode ser feita através da medição da suscetibilidade magnética das cascas de árvores colocadas em diferentes locais e assim fazer o mapeamento das zonas com diferente qualidade do ar o que permitirá o estabelecimento de normas adequadas às diferentes zonas.


Bibliografia consultada:

Baptista, Mafalda, et al, 2007, Copper, nickel and lead in lichen and tree bark transplants over different periods of time, Environmental Pollution (2008) 151,  408-413

Blackenburg, Friedhelm et al, 2009. Fractionation of metal stable isotopes by higher plants, Elements (2009) vol 5, 375-380

Brignole, Daniele, et al, Chemical and magnetic analyses on tree bark as an effective tool for biomonitoring: A case study in Lisbon (Portugal), Chemosphere (2018) 195, 508-514

Vezzola, Laura et al, 2017, Investigating distribution patterns of airborne magnetic grains trapped in tree barks in Milan, Italy: insights for pollution mitigation strategies, Geophys. J. Int. (2017) 210, 989–1000

As baleias podem mudar o clima!

A baleia azul é o maior animal que habita a Terra e é também o maior animal que já viveu no nosso planeta. É muito maior do que o maior dinossauro que alguma vez existiu e pesa o equivalente a 2000 pessoas. O seu coração é do tamanho de um carro pequeno e a dimensão dos seus vasos sanguíneos é tal que uma criança poderia nadar lá. Este gigante dos mares precisa de comer cerca de 4 toneladas de alimento por dia para manter a sua atividade. A sua principal fonte de alimento é o krill.

Baleia azul.
Krill do Antártico. (Fotografia de  Uwe Kils (https://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/deed.en))

Krill é o nome coletivo dado a um conjunto de espécies de animais invertebrados semelhantes ao camarão. São pequenos crustáceos constituintes do zooplâncton (plâncton animal) e que se alimentam de fitoplâncton (plâncton vegetal) e de algum zooplâncton. São a principal fonte de alimento de várias espécies de baleias assim como de outros animais como o tubarão-baleia e a jamanta.

Durante muito tempo pensava-se que se houvesse uma diminuição do número de baleias que se alimentam de krill a quantidade destes animais iria aumentar drasticamente, mas veio a provar-se que não era assim. O declínio do número de baleias que ocorreu devido à caça a estes animais na realidade levou à grande diminuição dos pequenos crustáceos do krill e não à sua expansão. Afinal o que aconteceu?

As baleias alimentam-se do krill nas grandes profundezas escuras do oceano e em seguida deslocam-se para a superfície para respirar. Quando se encontram à superfície as baleias eliminam fezes ricas em nutrientes como o ferro e o nitrogénio, elementos estes escassos nas águas superficiais. À superfície, em águas onde penetra a radiação solar, os microrganismos do fitoplâncton, que são a base da cadeia alimentar, os produtores, têm então acesso a estes nutrientes permitindo-lhes sobreviver e realizar a fotossíntese. A produção de matéria orgânica é assim assegurada pela fotossíntese com a utilização de dióxido de carbono e água na presença da luz. Desta forma o zooplâncton tem alimento à sua disposição, pois estes seres são predadores do fitoplâncton, o que lhe permite reproduzir-se, podendo ser ele próprio alimento para os outros níveis das cadeias alimentares.

A deslocação vertical das baleias na coluna de água, entre as zonas escuras e profundas e as zonas com luz da superfície, não só permite o transporte de nutrientes de uma zona onde abundam para uma zona onde escasseiam como ainda ao agitar a água, melhora a homogeneização dos nutrientes conduzindo ao desenvolvimento do fitoplâncton. O desenvolvimento dos produtores desencadeia assim a expansão do zooplâncton e consequentemente a proliferação das baleias. Este efeito, conhecido como cascata trófica, é afinal um processo ecológico que se inicia no topo da cadeia alimentar e que, como a água duma cascata que vai descendo ao longo de um declive, vai afetando todos os níveis alimentares que se encontram abaixo.

Mas então como é que as baleias podem mudar o clima? As baleias ao interferirem no nível dos produtores, os seres fotossintéticos, privilegiando com a sua presença o desenvolvimento destes seres microscópicos, aumentam a captação de dióxido de carbono que assim diminui a sua concentração na atmosfera. Como este gás é o principal contribuidor para o aumento acentuado do efeito de estufa e consequente aquecimento global, se diminui a concentração de dióxido de carbono na atmosfera porque fica armazenado no fundo do oceano quando estes seres morrem, então as baleias estão a contribuir para mudar o clima.


Para saber mais sobre baleias

A história dos minerais de quartzo apanhados nas Minas dos Carris há muitos anos

Quando eu era garota os meus pais tinham o hábito de nas férias grandes fazermos uns percursos de uma a duas semanas pelas belas terras portuguesas. Geralmente íamos mais para o interior uma vez que os outros 15 dias das férias eram dedicados à praia para podermos obter o iodo e a vitamina D que nos iriam permitir passar um inverno cheios de saúde.

No final dos anos setenta, porventura por sugestão minha, rumámos à serra do Gerês onde estabelecemos o acampamento base para os passeios pela serra. O nosso acampamento era constituído por uma tenda onde dormíamos os quatro da família, os meus pais, a minha irmã e eu, uma mesa, quatro bancos e um fogão de campismo. Acampámos num local lindíssimo, junto ao rio Homem, onde os desníveis permitiam a formação de cascatas e pequenas lagoas onde tomávamos gostosos banhos. Foi uma aventura extraordinária, já que naquele local não havia infraestruturas e não havia qualquer vedação. Durante a noite, quando ouvíamos o uivar dos lobos ou outros sons próximo da tenda, ficávamos em estado de alerta. Numa manhã, quando acordámos e abrimos o fecho da tenda, quem é que lá estava? Uma manada do típico gado bovino da serra do Gerês a circular em redor das tendas.

Uma vaca passeando-se entre as tendas e os carros.

Um dia o meu pai falando com outros campistas soube da possibilidade de fazer um percurso a pé para visitar as minas dos Carris. Eu fiquei entusiasmada, talvez mais do que o resto da família, e fizemos uma reunião do conselho familiar para analisar a possibilidade de ir até lá. Depois de conversarmos sobre os prós e os contras do passeio, lá decidimos ir até às Minas. Aconselharam-nos a irmos cedo pois o percurso demoraria algumas horas, ir e vir, sempre a pé.

Uma vista da Serra.

Num dia pela manhã bem cedo, com um belo farnel, que a minha mãe era bastante previdente no que toca a não passar fome, lá nos pusemos a caminho cheios de energia. Decidimos ir a pé pela estrada desde o acampamento até à Portela do Homem, onde começava o caminho para as Minas. A primeira hora de caminho, mais ou menos, pelo menos daquilo que me lembro, correu normalmente, mas… de repente o caminho tornou-se um percurso de obstáculos, muito cascalho e grandes blocos de granito ocupavam o caminho e por isso não nos bastava andar, tínhamos quase que escalar algumas dessas rochas. O sol entretanto subia no horizonte e o calor apertava. E a subida continuava. De vez em quando parávamos, bebíamos água, comíamos qualquer coisa e analisávamos a situação, se devíamos voltar para trás ou continuar, pois estávamos sempre à espera que aparecessem as Minas e ao fim de várias horas não havia sinal delas. Mas imbuídos do espírito de caminhantes lá continuámos. Lembro-me de que as paisagens eram extraordinárias, que atravessámos uma zona onde o percurso era mais fácil num planalto, de ver cavalos ao longe e de passar por grandes manadas de gado bovino a pastar. Ao fim de muitas horas lá avistámos as edificações abandonadas das Minas.

Sei agora que fizemos uma subida de cerca de 12km e vencemos um desnível de cerca de 800m, tendo atingido aproximadamente 1460m de altitude. Para 4 pessoas que não estavam habituadas a grandes caminhadas, não há dúvida que nos superámos.

Já na zona das Minas fiquei deslumbrada com os minerais que encontrava. Minerais de quartzo de variedades como quartzo fumado ou quartzo rosa abundavam pelo chão e também agregados de quartzo e feldspatos que eu ia encontrando e admirando. Nunca tinha visto minerais assim no seu meio ambiente e recolhi alguns que ainda hoje preservo e que já foram observados por muitas centenas dos meus alunos.

A Serra do Gerês é uma zona onde abundam os granitos que têm aproximadamente 290 a 300 milhões de anos. O granito é uma rocha magmática intrusiva, forma-se no interior da terra por solidificação do magma, e é constituído por quartzo, feldspatos, micas e anfíbolas. Apesar de se formar em profundidade esta rocha aflora à superfície, por movimentos ascendentes da própria rocha ou por erosão dos materiais sobrejacentes. Assim os minerais que eu ia encontrando tinham sido removidos da rocha aquando da exploração mineira para a recolha de volfrâmio e outros minérios.

A caminhada de regresso ao acampamento, apesar de ser quase sempre a descer, também não foi fácil pois continuámos a ter que escalar rochas e escorregar no cascalho, para além do cansaço acumulado nas muitas horas da subida. Chegámos já o sol se aproximava do horizonte, depois de cerca de 12 horas na serra e com o corpo a precisar de descanso.

Foram umas férias memoráveis.

Salmões, ursos e árvores

Sabemos que na Terra todos os seres vivos estão interligados, mas… Como podem estar diretamente associados salmões, ursos e árvores?

A história que vou contar passa-se na costa oeste dos Estados Unidos da América e tem como personagens três seres vivos que têm “estilos” de vida bastante diferentes: os salmões que são animais aquáticos, os ursos que são animais terrestres e ainda as árvores, plantas de porte elevado, elementos duma floresta.

Salmão a subir um rio.

Os salmões são peixes extraordinários que ao longo do seu ciclo de vida se deslocam dos rios, onde eclodiram a partir de ovos, para o oceano onde passam grande parte da sua vida adulta e que regressam ao rio onde ocorre a sua reprodução. Os salmões do Pacífico, Onchorhyncus sp. retornam ao rio em que nasceram. O regresso à agua doce é também a sua derradeira viagem, pois após a reprodução morrem. A reprodução só tem êxito em águas frias, transparentes, com sombra e com leito de cascalho. Para que os rios mantenham as condições propícias à reprodução do salmão tem que haver floresta nas margens e encostas do rio. As árvores da floresta fazem sombra no rio, o que não permite o aquecimento da água. É também a floresta que retém os sedimentos que iriam cobrir o cascalho caso esta não existisse.

Urso à pesca num rio.

Os ursos são mamíferos plantígrados, pois assentam no chão as “plantas” das patas, que têm uma pelagem espessa, cauda curta, bom olfato, garras não retráteis e que são omnívoros. Apesar de comerem de tudo, geralmente preferem alimentar-se de outros animais, de entre os quais podemos destacar os peixes. Durante os cerca de 45 dias que os salmões se mantêm no rio para a reprodução os ursos, assim como as águias por exemplo, têm à sua disposição um manancial de alimento. Os investigadores estimam que cerca de 70% das proteínas que estes ursos ingerem anualmente têm origem nos salmões.

As árvores são seres vivos produtores uma vez que, ao contrário dos animais, não necessitam de se alimentar de outros seres vivos para viverem. As árvores vão buscar ao ambiente apenas moléculas inorgânicas e com elas constroem as suas próprias moléculas orgânicas. São elementos químicos essenciais para o crescimento das árvores o carbono, o nitrogénio, o fósforo, entre outros, que são obtidos pelas árvores quer a partir do solo quer do ar.

Considerando cada um dos personagens em separado começamos a desvendar o mistério das relações, mas há ainda muito por revelar.

Quando um urso pesca um salmão, não o come imediatamente, leva-o para a floresta onde pode deliciar-se sossegadamente. O urso come apenas cerca de metade de cada salmão deixando na floresta o resto que é depois comido por águias, martas, corvos e gaivotas. O que estes animais não devoram fica então à mercê de insetos, escaravelhos e outros seres vivos. Passada uma semana já não há tecidos moles, só sobram os ossos. Durante este tempo alguns fluidos do salmão escorrem para o solo, impregnando-o com moléculas do salmão. As fezes de todos os animais que se alimentaram do salmão vão também enriquecer o solo com moléculas do salmão.

As moléculas do salmão que se encontram no solo são posteriormente retiradas do solo pelas raízes das árvores e desta maneira passam a fazer parte das moléculas da própria árvore. É interessante notar que em anos em que os salmões são abundantes as árvores crescem até cerca de três vezes mais do que quando os salmões escasseiam.

Nesta história de três personagens principais as interrelações são complexas e os seres afetam-se mutuamente assim como interagem com o meio físico. Os salmões precisam de florestas e rios saudáveis para se reproduzirem com sucesso e os ursos e as árvores precisam dos salmões. Os rios para serem saudáveis precisam das florestas ripícolas que lhes fazem sombra e retêm os sedimentos. Então podemos concluir que nesta rede intrincada de interligações os salmões precisam das florestas, mas as florestas precisam dos salmões. Ambientes que pareciam ser independentes estão assim intimamente ligados: os salmões são o alimento dos ursos e estes disponibilizam os nutrientes dos salmões às árvores da floresta e, por sua vez, a floresta saudável mantém os rios também saudáveis.


Fontes:

Voltei ao meu antigo liceu para fazer uma apresentação!

Ao longo da minha vida tenho alternado frequentemente entre o palco e a plateia da sala de aula apreciando os dois papéis e avaliando a dificuldade de cada um deles, nada melhor para avaliar um papel do que nos colocarmos nele. Mas desta vez fui ocupar o palco da escola que frequentei durante 4 anos, na altura do 3º ao 6º anos do liceu, agora seria do 7º ao 10º ano, a atual Escola Secundária Rainha D. Leonor. Olhei para aqueles alunos que silenciosamente me ouviam ou ordeiramente colocavam questões ou respondiam às minhas perguntas e vi-me também lá sentada.

Eu era uma aluna atenta e muito calada que adorava participar em atividades que a Escola Preparatória Luís António Verney que tinha frequentado nos dois anos anteriores nos facultava, mas na altura o liceu não nos proporcionava. Frequentemente quando pensava no Liceu Rainha D. Leonor pensava em como tinha detestado aquele tempo. Tinha frequentemente dores de estômago, os professores tinham connosco uma relação muito distante e a primeira aula que tinha tido lá tinha sido assustadora, em que a professora se tinha intitulado como a FERA. Sim, para mim era uma fera com letra maiúscula e quiçá tenha marcado o bater do meu coração de aluna naqueles anos. Apesar de nesses anos eu ter sido uma aluna média, algo apagada e escondida, não deixei de gostar de aprender e até da escola.

Quando ali de pé em frente aos alunos, lhes falava entusiasmada do projeto que lhes tinha ido apresentar, vieram-me à cabeça algumas situações que vivi naquela escola que afinal de contas foram muito boas. Situações divertidas, como o dia em que eu e uma amiga começámos a rir desalmadamente na aula de Lavores Femininos porque não conseguíamos enfiar uma agulha e a professora só nos desculpou porque era a primeira vez que acontecia. Situações de puro êxtase quando fui escolhida para ir cantar no Teatro São Luiz ou quando a professora de Inglês, de que ainda me lembro do nome, Olema Malheiro, nos desafiava a falar inglês de uma forma muito motivadora ou quando a professora de Físico-Química nos tratava carinhosamente. Na realidade no Liceu Rainha D. Leonor a vida acontecia, havia coisas motivadoras e coisas desmotivadoras, coisas alegres e coisas tristes, momentos bons e momentos maus,…

Foi muito bom ter ido à Escola Secundária Rainha D. Leonor, porque fui muito bem recebida, porque os alunos se mostraram muito interessados no projeto que lhes fui apresentar e de que vos falarei num próximo texto, mas também porque pude reequacionar a minha relação com o Liceu Rainha D. Leonor e pôr a fera, agora com letra minúscula, na posição que lhe é devida. O Liceu foi sem dúvida um local de aprendizagem de conteúdos disciplinares, de competências escolares e sociais e de crescimento pessoal.

Os lobos mudaram o curso dos rios no Parque de Yellowstone

Os lobos são mamíferos carnívoros que em tempos foram a espécie de mamífero selvagem terrestre mais largamente distribuída. Os lobos são os antepassados diretos dos nossos cães que resultaram de uma seleção artificial feita pelo homem na sua domesticação.

Os lobos são incluídos na família Canidae, como os coiotes, as raposas e os cães, e pertencem ao género Canis, a que também pertencem os cães. Apesar de haver lobos com aspetos bastante diferentes, estes são considerados subespécies da espécie dos lobos cinzentos, a espécie Canis lupus.

Os lobos são animais que podem pesar entre 18kg e 55kg aproximadamente e vivem habitualmente em pequenos grupos, as alcateias.

No Parque de Yellowstone, nos EUA, no século XX os lobos estiveram ausentes durante cerca de setenta anos devido à caça. Ao longo desses anos o Parque foi-se tornando progressivamente mais seco e com uma menor biodiversidade. Em 1995 foram reintroduzidos no Parque de Yellowstone 41 lobos. As mudanças que ocorreram foram simplesmente extraordinárias.

A ausência de lobos, sendo eles predadores de topo, levou ao aumento do número de veados como era de esperar, mas também levou a uma mudança nos hábitos dos veados que deixaram de se alimentar apenas nas orlas da floresta e passaram a dirigir-se para as vastas pradarias, tendo sido responsáveis pela destruição de grande parte da vegetação.

A reintegração dos lobos, apesar de poucos, desencadeou uma nova mudança nos hábitos dos veados que para se protegerem dos lobos passaram a movimentar-se ao abrigo das árvores e deram oportunidade para a regeneração da pradaria e mesmo para o crescimento das árvores e assim onde outrora havia zonas quase desérticas voltaram a aparecer florestas de álamos, choupos e salgueiros e com eles vieram as aves. Mais árvores trouxeram mais castores e com os castores vieram outros mamíferos como lontras e ratos almiscarados, também vieram répteis, anfíbios e peixes, a biodiversidade entrou no bom caminho. Este efeito que tem início no topo da cadeia alimentar e se propaga para os níveis inferiores é conhecido como cascata trófica e está também documentado noutras situações como por exemplo no efeito das baleias que se alimentam de krill na própria manutenção das populações de krill.

Por terem receio dos lobos os veados deixaram de se manter nas margens dos rios onde não só levavam à sobreexploração da vegetação como causavam diretamente a erosão dos solos com os seus cascos. A erosão era ainda amplificada pelo desaparecimento do coberto vegetal que deixava o solo despido e à mercê de todos os agentes de meteorização e erosão. A ausência dos veados nas margens dos rios e nas pradarias conduziu à estabilização das margens do rio que passaram a formar menos meandros e assim a terem um papel menor na erosão. Ocorreu um estreitamento dos canais fluviais e consequentemente a formação de estruturas diferenciadas ao longo do curso dos rios como lagoas e cascatas. Os rios mudaram no Parque de Yellowstone.

A chegada dos lobos provocou mudanças nos rios do Parque de Yellowstone!

Fontes: